Na semana passada falei que faria uma série de postagens sobre Hitchcock e hoje apresento pra vocês, uma análise da estética de “Um Corpo que Cai”. Incrivelmente ainda não tinha escrito sobre esse filme que, além de ser tao importante para a filmografia do diretor, é um dos meus favoritos.
Se você quer saber quais são os outros filmes que estão na minha lista, confere aqui.
Construção do visual
Pra começar, é incontestável que Hitchcock era um profissional perfeccionista e extremamente preocupado com o resultado final de suas obras. Nesse sentido, percebemos que ele foi inovador em diversos aspectos técnicos como a fotografia nesse caso, que tem o dolly zoom para simular a fobia do personagem principal, Scottie, interpretado por James Stuart.
A paleta de cores e a luz “Um Corpo que Cai”
E dessa forma, percebemos também como ele usa as cores de modo preciso e muito inovador pra época. Lembrando que “Vertigo” é de 1958 e seu primeiro filme colorido foi Festim Diabólico de 1948.
“Um Corpo Que Cai” traz seu conjunto de cores básico formado por azul, amarelo, verde e vermelho.
Midge
É interessante percebermos que cada personagem traz sua própria cor.
Inicialmente ficamos sabendo que Scottie adquiriu sua fobia por altura em função de um trauma causado por um acidente quando era investigador policial. Agora aposentado, ele passa boa parte do seu tempo com Midge, a quem somos apresentados nos primeiros minutos do filme e ela veste uma blusa amarela pastel.
Mais a frente sabemos que ela já foi noiva de Scottie e que hoje ele não a vê mais com interesse afetivo e ainda mais posteriormente, percebemos que ela o trata de forma quase que maternal.
Frequentemente associamos o amarelo ao sol e nesse sentido, entendemos que àquilo que é solar é bom, é positivo e alegre.
É só a gente pensar nos emojis e no smile, lembram?
Midge é uma pessoa otimista, acredita que Scottie possa se recuperar da fobia e está sempre ao seu lado quando ele precisa.
Scottie
Desde o inicio, percebemos uma forte presença do vermelho em sua volta.
Scottie usa um terno vermelho fechado, o escritório do amigo, Gavin, que o contrata para seguir a esposa é todo vermelho, o salão do restaurante onde ele conhece Madeleine, é vermelho.
Podemos entender que esta é a cor de Scottie.
Tendemos a seguir pelo óbvio, que o vermelho é a cor da paixão, da sedução e sim, estes sentimentos estão presentes no filme.
Principalmente quando surge em tonalidade mais intensa, mais saturada.
Mas vejo também como uma cor masculina e como um sinal de perigo à jornada que o protagonista está prestes a enfrentar.
O conceito de que o vermelho é uma cor masculina vem da antiguidade onde Goethe o chamava de “rei das cores”, da associação da cor ao que é agressivo, à força.
O oposto da delicadeza e da passividade do azul ou da inocência do branco, que são mais associadas às mulheres.
Além disso, até hoje na China, o vermelho pertence aos homens, as mulheres ficam com o preto e o branco.
Madeleine
Scottie aceita a proposta do amigo e resolve seguir sua esposa, Madeleine, interpretada pela lindíssima Kim Novak.
Naquele mesmo salão de restaurante todo vermelho, ele avista a mulher que usa um belo vestido verde.
Ela sobressai aos olhos de qualquer um, justamente porque verde e vermelho são cores complementares, opostas. E fica combinado que essa é a cor de Madeleine!
O sentimento associado ao verde, geralmente é da natureza, da vida e de saúde. Mas quando combinada ao preto, conjunto de cores que ela usa no restaurante, temos o sentimento oposto. Hitchcock está nos dando a dica de que esta personagem representa a morte!
Vejo também que o verde pode ser relacionado como uma cor feminina, pois se pensarmos em nomes próprios advindos da cor temos: Flora (deusa das flores e plantas), Silvia (em latim significa selva), Olivia (que vem das oliveiras), Esmeralda (que vem da pedra p reciosa), entre outros.
É engraçado como Hitchcock brincou com as cores em “Um Corpo Que Cai”, pois vemos que Madeleine usa um carro na cor verde e a porta da casa de Scottie é vermelha. Logo após salvá-la de uma tentativa de suicídio, vemos ela na casa dele usando um robe na cor vermelha e ele usa um suéter verde. É como se os personagens estivessem se misturando, pois irão se apaixonar.
Nesse momento, podemos associar o conceito de que ela usa vermelho pois é um interesse afetivo para Scottie, ela mais parece uma maçã, aquela do pecado.
Pois Madeleine é esposa de seu amigo.
Direção de Arte
Outro aspecto bem inteligente do uso de imagem para a compreensão do filme são as associações criadas através da direção de arte.
Temos padronagens florais que combina muito com o plot twist que vemos na segunda metade do filme.
As flores nos remetem a um grande funeral que está prestes a acontecer, bem com todo o ar fantasmagórico e de horror estabelecido por Hitchcock.
Assim como as formas geométricas circulares que se evidenciam a todo instante, no cabelo de Madeleine, nos óculos de Midge, nas almofadas de seu apartamento, na abertura do filme vemos um grande close-up nos olhos da atriz e isso faz com que estejamos alinhados com a fobia de Scottie.
Figurino
O grande destaque do figurino fica com o terno cinza eternizado por Kim Novak e é extremamente simbólico.
Acho que foi uma escolha muito acertada na cor pois o cinza é a cor da dúvida.
O cinza não nos permite distinguir o preto do branco, existe um espaço para incompreensão naquilo que é cinza. Não é verdade?
Além disso, é uma cor que sempre precisa do auxílio de outras pra saber quem quer ser: pra ser quente precisa de amarelo; pra ser fria precisa do azul. E assim, Hitchcock construiu uma personagem ambígua, de quem nada se sabe, que não sabemos se é boa ou má.
Nesse mesmo sentido, podemos dizer que a cor da roupa de Madeleine está a todo no momento nos avisando de seu destino. O cinza é a cor das adversidades que destroem a alegria de viver, afinal de contas, qual o dia que se encerra o carnaval? Quarta-feira de cinzas, certo?
Toda cor que se mistura ao branco ou preto acaba ficando turva, sem luminosidade.
Ao contrário do laranja e do amarelo que estão muito relacionados aos sentimentos de alegria e de vida, o cinza representa a cor da tristeza, das lágrimas.
Como exemplo no filme, podemos citar o jazigo de Carlota Valdes, que é cinza, mas vem iluminado com o verde de Madeleine.
Referências
Se você, assim como eu, ama Hitchcock, não pode deixar de ter esse livro incrível na sua coleção. Além disso, comprando no link ao lado, você me ajuda a manter o site do COLOR e me incentiva a continuar produzindo conteúdos como esse.
Este é um link de afiliado e você não terá nenhum custo extra ao comprar o produto. Somente irei ganhar um percentual caso você efetue a compra.
Aproveita que tá com um preço super especial na Amazon! 😉
Eu adoro “Um Corpo Que Cai” e acho uma das melhores histórias do Cinema Mundial, de todos os tempos.
Clica aqui pra ver outros filmes que eu amo do Hitchcock e me conta nos comentários: qual é seu filme favorito dele?
Se você curtiu esse artigo e quer continuar em contato comigo, me segue nas redes sociais!